domingo, 9 de agosto de 2009

FIGURAS DE LINGUAGEM

Figuras de Linguagem

As figuras de linguagem ou de estilo são empregadas para valorizar o texto, tornando a linguagem mais expressiva. É um recurso lingüístico para expressar experiências comuns de formas diferentes, conferindo originalidade, emotividade ou poeticidade ao discurso.
As figuras revelam muito da sensibilidade de quem as produz, traduzindo particularidades estilísticas do autor. A palavra empregada em sentido figurado, não- denotativo, passa a pertencer a outro campo de significação, mais amplo e criativo.
As figuras de linguagem classificam-se em:
a)figuras de palavras;
b)figuras de harmonia;
c)figuras de pensamento;
d)figuras de construção ou sintaxe.

FIGURAS DE PALAVRA

As figuras de palavra consistem no emprego de um termo com sentido diferente daquele convencionalmente empregado, a fim de se conseguir um efeito mais expressivo na comunicação.
São figuras de palavras:
a) comparação e) catacrese
b) metáfora f) sinestesia
c) metonímia g) antonomásia
d) sinédoque h) alegoria
· Comparação
Ocorre comparação quando se estabelece aproximação entre dois elementos que se identificam, ligados por conectivos comparativos explícitos - feito, assim como, tal, como, tal qual, tal como, qual, que nem - e alguns verbos - parecer, assemelhar-se e outros.

Exemplos:
"Amou daquela vez como se fosse máquina.

Beijou sua mulher como se fosse lógico."
(Chico Buarque)

"As solteironas, os longos vestidos negros fechados no pescoço, negros xales nos ombros, pareciam aves noturnas paradas..."
(Jorge Amado)
· Metáfora
Ocorre metáfora quando um termo substitui outro através de uma relação de semelhança resultante da subjetividade de quem a cria. A metáfora também pode ser entendida como uma comparação abreviada, em que o conectivo não está expresso, mas subentendido.

Exemplo:
"Supondo o espírito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, é ver se posso extrair pérolas, que é a razão."
(Machado de Assis)
· Metonímia
Ocorre metonímia quando há substituição de uma palavra por outra, havendo entre ambas algum grau de semelhança, relação, proximidade de sentido ou implicação mútua. Tal substituição fundamenta-se numa relação objetiva, real, realizando-se de inúmeros modos:

o continente pelo conteúdo e vice-versa:
Antes de sair, tomamos um cálice1 de licor.
1 O conteúdo de um cálice.

a causa pelo efeito e vice-versa:
"E assim o operário ia
Com suor e com cimento 2
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento."
(Vinicius de Moraes)
2 Com trabalho.

o lugar de origem ou de produção pelo produto:
Comprei uma garrafa do legítimo porto 3.
3 O vinho da cidade do Porto.

o autor pela obra:
Ela parecia ler Jorge Amado 4.
4 A obra de Jorge Amado.

o abstrato pelo concreto e vice-versa:
Não devemos contar com o seu coração 5.
5 Sentimento, sensibilidade.

o símbolo pela coisa simbolizada:
A coroa 6 foi disputada pelos revolucionários.
6 O poder.

a matéria pelo produto e vice-versa:
Lento, o bronze 7 soa.
7 O sino.

o inventor pelo invento:
Edson 8 ilumina o mundo.
8 A energia elétrica.

a coisa pelo lugar:
Vou à Prefeitura 9.
9 Ao edifício da Prefeitura.

o instrumento pela pessoa que o utiliza:
Ele é um bom garfo 10.
10 Guloso, glutão.

· Sinédoque
Ocorre sinédoque quando há substituição de um termo por outro, havendo ampliação ou redução do sentido usual da palavra numa relação quantitativa. Encontramos sinédoque nos seguintes casos:

o todo pela parte e vice-versa:
"A cidade inteira 1 viu assombrada, de queixo caído, o pistoleiro sumir de ladrão, fugindo nos cascos 2 de seu cavalo."
(J. Cândido de Carvalho)
1 O povo.
2 Parte das patas.

o singular pelo plural e vice-versa:
O paulista 3 é tímido; o carioca 4, atrevido.
3 Todos os paulistas.
4 Todos os cariocas.

o indivíduo pela espécie (nome próprio pelo nome comum):
Para os artistas ele foi um mecenas 5.
5 Protetor.
Modernamente, a metonímia engloba a sinédoque.
· Catacrese
A catacrese é um tipo de especial de metáfora, "é uma espécie de metáfora desgastada, em que já não se sente nenhum vestígio de inovação, de criação individual e pitoresca. É a metáfora tornada hábito lingüístico, já fora do âmbito estilístico."
(Othon M. Garcia)

São exemplos de catacrese:
folhas de livro pele de tomate
dente de alho montar em burro
céu da boca cabeça de prego
mão de direção ventre da terra
asa da xícara sacar dinheiro no banco
· Sinestesia
A sinestesia consiste na fusão de sensações diferentes numa mesma expressão. Essas sensações podem ser físicas (gustação, audição, visão, olfato e tato) ou psicológicas (subjetivas).

Exemplo:
"A minha primeira recordação é um muro velho, no quintal de uma casa indefinível. Tinha várias feridas no reboco e veludo de musgo. Milagrosa aquela mancha verde [sensação visual] e úmida, macia [sensações táteis], quase irreal."
(Augusto Meyer)
· Antonomásia
Ocorre antonomásia quando designamos uma pessoa por uma qualidade, característica ou fato que a distingue.
Na linguagem coloquial, antonomásia é o mesmo que apelido, alcunha ou cognome, cuja origem é um aposto (descritivo, especificativo etc.) do nome próprio.

Exemplos:
"E ao rabi simples 1, que a igualdade prega,
Rasga e enlameia a túnica inconsútil;
(Raimundo Correia)
1 Cristo

Pelé (= Edson Arantes do Nascimento)
O Cisne de Mântua (= Virgílio)
O poeta dos escravos (= Castro Alves)
O Dante Negro (= Cruz e Souza)
O Corso (= Napoleão)
· Alegoria
A alegoria é uma acumulação de metáforas referindo-se ao mesmo objeto; é uma figura poética que consiste em expressar uma situação global por meio de outra que a evoque e intensifique o seu significado. Na alegoria, todas as palavras estão transladadas para um plano que não lhes é comum e oferecem dois sentidos completos e perfeitos - um referencial e outro metafórico.

Exemplo:
"A vida é uma ópera, é uma grande ópera. O tenor e o barítono lutam pelo soprano, em presença do baixo e dos comprimários, quando não são o soprano e o contralto que lutam pelo tenor, em presença do mesmo baixo e dos mesmos comprimários. Há coros numerosos, muitos bailados, e a orquestra é excelente..."
(Machado de Assis)


FIGURAS DE HARMONIA

Chamam-se figuras de som ou de harmonia os efeitos produzidos na linguagem quando há repetição de sons ou, ainda, quando se procura "imitar"sons produzidos por coisas ou seres.
As figuras de harmonia ou de som são:

a) aliteração c) assonância
b) paronomásia d) onomatopéia
· Aliteração
Ocorre aliteração quando há repetição da mesma consoante ou de consoantes similares, geralmente em posição inicial da palavra.

Exemplo:
"Toda gente homenageia Januária na janela."
(Chico Buarque)
· Assonância
Ocorre assonância quando há repetição da mesma vogal ao longo de um verso ou poema.

Exemplo:
"Sou Ana, da cama
da cana, fulana, bacana
Sou Ana de Amsterdam."
(Chico Buarque)
· Paronomásia
Ocorre paronomásia quando há reprodução de sons semelhantes em palavras de significados diferentes.

Exemplo:
"Berro pelo aterro pelo desterro
berro por seu berro pelo seu erro
quero que você ganhe que você me apanhe
sou o seu bezerro gritando mamãe."
(Caetano Veloso)
· Onomatopéia
Ocorre quando uma palavra ou conjunto de palavras imita um ruído ou som.

Exemplo:
"O silêncio fresco despenca das árvores.
Veio de longe, das planícies altas,
Dos cerrados onde o guaxe passe rápido...
Vvvvvvvv... passou."
(Mário de Andrade)

"Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno."
(Fernando Pessoa)


FIGURAS DE PENSAMENTO

As figuras de pensamento são recursos de linguagem que se referem ao significado das palavras, ao seu aspecto semântico.
São figuras de pensamento:
a) antítese d) apóstrofe g) paradoxo
b) eufemismo e) gradação h) hipérbole
c) ironia f) prosopopéia i) perífrase
· Antítese
Ocorre antítese quando há aproximação de palavras ou expressões de sentidos opostos.

Exemplo:
"Amigos ou inimigos estão, amiúde, em posições trocadas. Uns nos querem mal, e fazem-nos bem. Outros nos almejam o bem, e nos trazem o mal."
(Rui Barbosa)
· Apóstrofe
Ocorre apóstrofe quando há invocação de uma pessoa ou algo, real ou imaginário, que pode estar presente ou ausente. Corresponde ao vocativo na análise sintática e é utilizada para dar ênfase à expressão.

Exemplo:
"Deus! ó Deus! onde estás, que não respondes?"
(Castro Alves)
· Paradoxo
Ocorre paradoxo não apenas na aproximação de palavras de sentido oposto, mas também na de idéias que se contradizem referindo-se ao mesmo termo. É uma verdade enunciada com aparência de mentira. Oxímoro (ou oximoron) é outra designação para paradoxo.

Exemplo:
"Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;"
(Camões)
· Eufemismo
Ocorre eufemismo quando uma palavra ou expressão é empregada para atenuar uma verdade tida como penosa, desagradável ou chocante.

Exemplo:
"E pela paz derradeira1 que enfim vai nos redimir Deus lhe pague".
(Chico Buarque)
1 paz derradeira: morte
· Gradação
Ocorre gradação quando há uma seqüência de palavras que intensificam uma mesma idéia.

Exemplo:
"Aqui... além... mais longe por onde eu movo o passo."
(Castro Alves)
· Hipérbole
Ocorre hipérbole quando há exagero de uma idéia, a fim de proporcionar uma imagem emocionante e de impacto.

Exemplo:
"Rios te correrão dos olhos, se chorares!"
(Olavo Bilac)
· Ironia
Ocorre ironia quando, pelo contexto, pela entonação, pela contradição de termos, sugere-se o contrário do que as palavras ou orações parecem exprimir. A intenção é depreciativa ou sarcástica.

Exemplo:
"Moça linda, bem tratada,
três séculos de família,
burra como uma porta:
um amor."
(Mário de Andrade)
· Prosopopéia
Ocorre prosopopéia (ou animização ou personificação) quando se atribui movimento, ação, fala, sentimento, enfim, caracteres próprios de seres animados a seres inanimados ou imaginários.
Também a atribuição de características humanas a seres animados constitui prosopopéia o que é comum nas fábulas e nos apólogos, como este exemplo de Mário de Quintana: "O peixinho (...) silencioso e levemente melancólico..."
Exemplos:
"... os rios vão carregando as queixas do caminho."
(Raul Bopp)
Um frio inteligente (...) percorria o jardim..."
(Clarice Lispector)
· Perífrase
Ocorre perífrase quando se cria um torneio de palavras para expressar algum objeto, acidente geográfico ou situação que não se quer nomear.

Exemplo:
"Cidade maravilhosa
Cheia de encantos mil
Cidade maravilhosa
Coração do meu Brasil."
(André Filho)


FIGURAS DE SINTAXE

As figuras de sintaxe ou de construção dizem respeito a desvios em relação à concordância entre os termos da oração, sua ordem, possíveis repetições ou omissões.
Elas podem ser construídas por:
a) omissão: assíndeto, elipse e zeugma;
b) repetição: anáfora, pleonasmo e polissíndeto;
c) inversão: anástrofe, hipérbato, sínquise e hipálage;
d) ruptura: anacoluto;
e) concordância ideológica: silepse.

Portanto, são figuras de construção ou sintaxe:
a) assíndeto e) elipse i) zeugma
b) anáfora f) pleonasmo j) polissíndeto
c) anástrofe g) hiperbato l) sínquise
d) hipálage h) anacoluto m) silepse
· Assíndeto
Ocorre assíndeto quando orações ou palavras deveriam vir ligadas por conjunções coordenativas, aparecem justapostas ou separadas por vírgulas.
Exigem do leitor atenção maior no exame de cada fato, por exigência das pausas rítmicas (vírgulas).

Exemplo:
"Não nos movemos, as mãos é que se estenderam pouco a pouco, todas quatro, pegando-se, apertando-se, fundindo-se."
(Machado de Assis)
· Elipse
Ocorre elipse quando omitimos um termo ou oração que facilmente podemos identificar ou subentender no contexto. Pode ocorrer na supressão de pronomes, conjunções, preposições ou verbos. É um poderoso recurso de concisão e dinamismo.

Exemplo:
"Veio sem pinturas, em vestido leve, sandálias coloridas." 1
1 Elipse do pronome ela (Ela veio) e da preposição de (de sandálias...)
· Zeugma
Ocorre zeugma quando um termo já expresso na frase é suprimido, ficando subentendida sua repetição.

Exemplo:
"Foi saqueada a vida, e assassinados os partidários dos Felipes." 1
(Camilo Castelo Branco)
1 Zeugma do verbo: "e foram assassinados..."
· Anáfora
Ocorre anáfora quando há repetição intencional de palavras no início de um período, frase ou verso.

Exemplo:
"Depois o areal extenso...
Depois o oceano de pó...
Depois no horizonte imenso
Desertos... desertos só..."
(Castro Alves)

· Pleonasmo
Ocorre pleonasmo quando há repetição da mesma idéia, isto é, redundância de significado.

a) Pleonasmo literário
É o uso de palavras redundantes para reforçar uma idéia, tanto do ponto de vista semântico quanto do ponto de vista sintático. Usado como um recurso estilístico, enriquece a expressão, dando ênfase à mensagem.

Exemplo:
"Iam vinte anos desde aquele dia
Quando com os olhos eu quis ver de perto
Quando em visão com os da saudade via."
(Alberto de Oliveira)

"Morrerás morte vil na mão de um forte."
(Gonçalves Dias)

"Ó mar salgado, quando do teu sal
São lágrimas de Portugal"
(Fernando Pessoa)

b) Pleonasmo vicioso
É o desdobramento de idéias que já estavam implícitas em palavras anteriormente expressas. Pleonasmos viciosos devem ser evitados, pois não têm valor de reforço de uma idéia, sendo apenas fruto do descobrimento do sentido real das palavras.

Exemplos:
subir para cima entrar para dentro
repetir de novo ouvir com os ouvidos
hemorragia de sangue monopólio exclusivo
breve alocução principal protagonista
· Polissíndeto
Ocorre polissíndeto quando há repetição enfática de uma conjunção coordenativa mais vezes do que exige a norma gramatical ( geralmente a conjunção e). É um recurso que sugere movimentos ininterruptos ou vertiginosos.

Exemplo:
"Vão chegando as burguesinhas pobres,
e as criadas das burguesinhas ricas
e as mulheres do povo, e as lavadeiras da redondeza."
(Manuel Bandeira)
· Anástrofe
Ocorre anástrofe quando há uma simples inversão de palavras vizinhas ( determinante/determinado).

Exemplo:
"Tão leve estou 1 que nem sombra tenho."
(Mário Quintana)
1 Estou tão leve...
· Hipérbato
Ocorre hipérbato quando há uma inversão completa de membros da frase.

Exemplo:
"Passeiam à tarde, as belas na Avenida. " 1
(Carlos Drummond de Andrade)
1 As belas passeiam na Avenida à tarde.
· Sínquise
Ocorre sínquise quando há uma inversão violenta de distantes partes da frase. É um hipérbato exagerado.

Exemplo:
"A grita se alevanta ao Céu, da gente. " 1
(Camões)
1 A grita da gente se alevanta ao Céu.
· Hipálage
Ocorre hipálage quando há inversão da posição do adjetivo: uma qualidade que pertence a uma objeto é atribuída a outro, na mesma frase.

Exemplo:
"... as lojas loquazes dos barbeiros." 2
(Eça de Queiros)
2 ... as lojas dos barbeiros loquazes.
· Anacoluto
Ocorre anacoluto quando há interrupção do plano sintático com que se inicia a frase, alterando-lhe a seqüência lógica. A construção do período deixa um ou mais termos - que não apresentam função sintática definida - desprendidos dos demais, geralmente depois de uma pausa sensível.

Exemplo:
"Essas empregadas de hoje, não se pode confiar nelas."
(Alcântara Machado)
· Silepse
Ocorre silepse quando a concordância não é feita com as palavras, mas com a idéia a elas associada.

a) Silepse de gênero
Ocorre quando há discordância entre os gêneros gramaticais (feminino ou masculino).

Exemplo:
"Quando a gente é novo, gosta de fazer bonito."
(Guimarães Rosa)

b) Silepse de número
Ocorre quando há discordância envolvendo o número gramatical (singular ou plural).

Exemplo:
Corria gente de todos lados, e gritavam."
(Mário Barreto)

c) Silepse de pessoa
Ocorre quando há discordância entre o sujeito expresso e a pessoa verbal: o sujeito que fala ou escreve se inclui no sujeito enunciado.

Exemplo:
"Na noite seguinte estávamos reunidas algumas pessoas."
(Machado de Assis)

DENOTAÇÃO E CONOTAÇÃO

DENOTAÇÃO E CONOTAÇÃO
Estes dois conceitos são muito fáceis de entender se lembrarmos que duas partes distintas, mas interdependentes, constituem o signo lingüístico: o significante ou plano da expressão - uma parte perceptível, constituída de sons - e o significado ou plano do conteúdo - a parte inteligível, o conceito. Por isto, numa palavra que ouvimos, percebemos um conjunto de sons ( o significante), que nos faz lembrar de um conceito (o significado).
A denotação é justamente o resultado da união existente entre o significante e o significado, ou entre o plano da expressão e o plano do conteúdo. A conotação resulta do acréscimo de outros significados paralelos ao significado de base da palavra, isto é, um outro plano de conteúdo pode ser combinado ao plano da expressão. Este outro plano de conteúdo reveste-se de impressões, valores afetivos e sociais, negativos ou positivos, reações psíquicas que um signo evoca.
Portanto, o sentido conotativo difere de uma cultura para outra, de uma classe social para outra, de uma época a outra. Por exemplo, as palavras senhora, esposa, mulher denotam praticamente a mesma coisa, mas têm conteúdos conotativos diversos, principalmente se pensarmos no prestígio que cada uma delas evoca.
Desta maneira, podemos dizer que os sentidos das palavras compreendem duas ordens: referencial ou denotativa e afetiva ou conotativa.
A palavra tem valor referencial ou denotativo quando é tomada no seu sentido usual ou literal, isto é, naquele que lhe atribuem os dicionários; seu sentido é objetivo, explícito, constante. Ela designa ou denota determinado objeto, referindo-se à realidade palpável.
Denotação é a significação objetiva da palavra; é a palavra em "estado de dicionário"
Além do sentido referencial, literal, cada palavra remete a inúmeros outros sentidos, virtuais, conotativos, que são apenas sugeridos, evocando outras idéias associadas, de ordem abstrata, subjetiva.
Conotação é a significação subjetiva da palavra; ocorre quando a palavra evoca outras realidades por associações que ela provoca
O quadro abaixo sintetiza as diferenças fundamentais entre denotação e conotação:
DENOTAÇÃO
CONOTAÇÃO
palavra com significação restrita
palavra com significação ampla
palavra com sentido comum do dicionário
palavra cujos sentidos extrapolam o sentido comum
palavra usada de modo automatizado
palavra usada de modo criativo
linguagem comum
linguagem rica e expressiva

a) Exemplos de conotação e denotação (textos 1 e 2)
Para exemplificar, de maneira simples e clara, estes dois conceitos, vamos tomar a palavra cão: terá um sentido denotativo quando designar o animal mamífero quadrúpede canino; terá um sentido conotativo quando expressar o desprezo que desperta em nós uma pessoa sem caráter ou extremamente servil. (Otto M.Garcia, 1973)
Nas receitas abaixo, as palavras têm, na primeira, um sentido objetivo, explícito, constante; foram usadas denotativamente. Na segunda, apresentam múltiplos sentidos, foram usadas conotativamente. Observa-se que os verbos que ocorrem tanto em uma quanto em outra - dissolver, cortar, juntar, servir, retirar, reservar - são aqueles que costumam ocorrer nas receitas; entretanto, o que faz a diferença são as palavras com as quais os verbos combinam, combinações esperadas no texto 1, combinações inusitadas no texto 2.
TEXTO I
Bolo de arroz
3 xícaras de arroz 1 colher (sopa) de manteiga 1 gema 1 frango 1 cebola picada 1colher (sopa) de molho inglês 1colher (sopa) de farinha de trigo 1 xícara de creme de leite salsa picadinha
Prepare o arroz branco, bem solto. Ao mesmo tempo, faça o frango ao molho, bem temperado e saboroso. Quando pronto, retire os pedaços, desosse e desfie. Reserve. Quando o arroz estiver pronto, junte a gema, a manteiga, coloque numa forma de buraco e leve ao forno. No caldo que sobrou do frango, junte a cebola, o molho inglês, a farinha de trigo e leve ao fogo para engrossar. Retire do fogo e junte o creme de leite. Vire o arroz, já assado, num prato. Coloque o frango no meio e despeje por cima o molho. Sirva quente.
(Terezinha Terra)
TEXTO II
Receita
Ingredientes
2 conflitos de gerações 4 esperanças perdidas 3 litros de sangue fervido 5 sonhos eróticos 2 canções dos beatles
Modo de preparar
Dissolva os sonhos eróticos nos dois litros de sangue fervido e deixe gelar seu coração.
Leve a mistura ao fogo, adicionando dois conflitos de gerações às esperanças perdidas.
Corte tudo em pedacinhos e repita com as canções dos beatles o mesmo processo usado com os sonhos eróticos, mas desta vez deixe ferver um pouco mais e mexa até dissolver.
Parte do sangue pode ser substituído por suco de groselha, mas os resultados não serão os mesmos.
Sirva o poema simples ou com ilusões. (Nicolas Behr)
b) Exemplo de texto denotativo (texto 3)
Os textos informativos (científicos e jornalísticos), por serem, em geral, objetivos, prendem-se ao sentido denotativo das palavras. Vejamos o texto abaixo, em que a linguagem está estruturada em expressões comuns, com um sentido único.
Texto 3 - texto técnico-científico
Canibalismo entre insetos
Seres que nascem na cabeça de outros e que consomem progressivamente o corpo destes até aniquilá-los, ao atingir o estágio adulto. ... Esse é um enredo que mais parece de ficção científica. No entanto, acontece desde a pré-história, tendo como protagonistas as vespas de certas espécies e as paquinhas, e é um exemplo da curiosa relação dos ‘inimigos naturais’, aproveitada pelo homem no controle biológico de pragas, para substituir com muitas vantagens os inseticidas químicos.
(Revista Ciência Hoje, nº 104, outubro de 1994, Rio, SBPC)
c) Exemplo de texto conotativo (texto 4)
Além dos poetas, os humoristas e os publicitários fazem um amplo uso das palavras no seu sentido conotativo, o que contribui para que os anúncios despertem a atenção dos prováveis consumidores e para que o dito humorístico atinja o seu objetivo de fazer rir, às vezes até com uma certa dose de ironia.
Por exemplo, na propaganda de um ‘shopping’, foi usada a seguinte frase:
Texto 4 - propaganda
O Rio Design Center acaba de ganhar um novo piso.Marmoleumo piso natural(Revista Veja Rio, maio/junho,96)
O anúncio tem aí um duplo sentido, pois transmite duas informações:
o Rio Design Center ganhou uma nova loja - PAVIMENTO SUPERIOR -onde estão à venda pisos especiais;
nesta loja é possível encontrar o material para piso, importado da Holanda, que se chama Marmoleum.
Na frase que fecha o anúncio, desfaz-se a ambigüidade: "Venha até a (ao invés de o) Pavimento Superior e confira esta e outras novidades de revestimentos para pisos". Mas a frase de abertura faz pensar em outros sentidos: o centro comercial ganhou um novo andar, um novo pavimento, ou ganhou um revestimento novo em todo o seu piso, em todo o seu chão.
d) Exemplo de conotação
Os provérbios ou ditos populares são também um outro exemplo de exploração da linguagem no seu uso conotativo. Assim, "Quem está na chuva é para se molhar" equivale a "/Quando alguém opta por uma determinada experiência, deve assumir todas as regras e conseqüências decorrentes dessa experiência". Do mesmo modo, "Casa de ferreiro, espeto de pau" significa O que a pessoa faz fora de casa, para os outros, não faz em casa, para si mesma.
A respeito de conotação, Othon M. Garcia (1973) observa: "Conotação implica, portanto, em relação à coisa designada, um estado de espírito, uma opinião, um juízo, um sentimento, que variam conforme a experiência, o temperamento, a sensibilidade, a cultura e os hábitos do falante ou ouvinte, do autor ou leitor. Conotação é, assim, uma espécie de emanação semântica, possível graças à faculdade que nos permite relacionar coisas análogas ou semelhadas. Esse é, em essência, o traço característico do processo metafórico, pois metaforização é conotação".

vaca, um burro, uma besta.